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Haicais
de Carlos Martins
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Haicai: Um caminho de vida em tres versos.
Mais
um jogador
no gramado seco do estádio —
O quero-quero.
Árvores
sem folhas
no caminho de volta
à
terra natal.
Dia
da Independência
—
Som de água no tanque
e mais nada.
Estrada
de inverno —
Solitário, exatamente,
como anos atrás.
O
vento livre
no vagão vazio de gente —
Final de inverno.
Flocos
de algodão —
No sorriso da menina,
o campo branco.
Calçada
perfumada —
Cheiro das folhas no chão,
depois da garoa.
Fumaça
de incenso
dança suave com seu par —
Brisa de inverno.
Ve-se
do avião
somente pontos de luz —
Noite sem lua.
Afinam
o coro —
Mosquitos de primavera
voando no quarto.
Forte
sol de inverno —
Lembro dos ovos no carro,
ao fazer haicais.
Flores
de inverno —
Na estrada, elas também,
cheias de poeira.
Poetas
no renga —
Crisântemos amarelos
e o Buda, observam.
Vento
cortante —
Vizinhos falam do tempo,
além de bom dia.
Luz
do meio dia —
Azaléias...Azaléias
na avenida inteira.
A
favor do vento,
As folhas secas no chão
abrem meu caminho...
Imito
a tosse
matinal de minha mãe —
Netas se divertem.
Noite
sem fim —
Pelos cantos do velório,
os hálitos brancos.
Altar
de Buda —
Conserva a etiqueta de preço,
melão da oferenda.
Ocaso
de inverno —
Mulher conduz o marido
que fala sozinho.
Manhã
de sol —
Passeia no prado seco
a senhora miúda.
Canta
o sabiá —
Nova música ambiente
toca no escritório.
Pequena
aranha
é despejada de casa —
Lavagem de escarola.
O
ar cinza —
Nuvem de poluição
envolve a cidade.
Acaba
a solidão
do café da manhã --
Lesma peregrina.
Vento
da manhã —
Com pétalas quase brancas,
a azaléia cai.
Cresce
na varanda
do casarão em ruínas —
Capim de inverno.
Rosa
de inverno —
Suavemente balança
ao vento da tarde.
Visão
delicada —
Na pequena cerejeira,
primeira florada.
Luz
do crepúsculo —
Evolui sobre a lagoa,
urubu solitário.
Adultos
sem jeito
nas brincadeiras de roda —
Dia dos Pais na escola.
Flores
de cerejeira —
Úmidos na madrugada,
quatro botões.
Canteiro
de obra —
A azaléia florida
em meio ao entulho.
Céu
azul de inverno —
Na janela do avião,
olhos de menino.
Encrespa
as águas
da Baía de Guanabara —
Vento de inverno.
Um
haicai da Mestra,
no avião, comigo viaja —
Noite de inverno.
Parque
de inverno —
O gira-gira rodando
sem ninguém por perto.
Ah!
Dia dos Pais —
Carinhos escritos das filhas
em toda parte.
Distante
dos seus,
voa com os urubus —
Atobá solitário.
Acordo
mais cedo —
O casal de maritacas
namora no telhado.
Aurora
de inverno —
De um telhado de barro,
lento, o sol nasce.
Noite
de geada —
Recados de namorados
no vidro do carro.
As
sardas pintadas,
lambuzadas com canjica —
Caipirinha urbana.
Com
jeito infantil,
velhos disputam canjica
no fogão a lenha.
Por
do sol dourado -
As pipas observam os guris
em cima das lajes.
Madrugada
fria —
Pelas ruas desertas,
caminho intranqüilo.
Casarão
antigo —
Nos azulejos desbotados,
a chuva de inverno.
Maciez
ao toque —
A penugem de musgo
na araucária fêmea.
Pinheiros
do brejo —
Uma alameda de galhos
na entrada do parque.
Sob
as águas lentas,
o desenho das pedras —
Cachoeira de inverno.
Lagoa
de inverno —
Os patos brancos grasnando,
despertam o vale.
Árvore
sem folha —
o vento da manhã sopra
sem deixar presença.
Na
calma lagoa,
ilhas no céu azul refletido —
Aguapés de inverno.
Trilha
de inverno —
Para vencer a subida,
cajado na mão.
Caminha
solitária,
na flor quase sem vida —
Abelha de inverno.
Floresta
de inverno —
subitamente os caminhos
desaparecem.
Música
suave —
O som da água gelada
que cai da barragem.
Lua
de inverno —
Mendigo procura um canto,
para o cobertor fino.
Flores
de azaléia —
Na cerca viva esta manhã
muito mais vida.
Manhã
de inverno —
Canta, à
primeira luz,
um galo rouco.
Inverno
a meio —
Sem se importar com a moda,
as pessoas na rua.
Cristo
Redentor —
O capim de inverno curva-se
ao vento constante.
Noite
de inverno —
Levita sobre a cidade,
o Cristo iluminado.
Um
dedo de pedra,
Sustenta as nuvens no céu —
Serra de inverno.
Beira
da praia —
Rodeados de folhas secas,
garis se concentram.
Mar
de inverno —
Os solitários da orla,
sempre acompanhados.
Céu
azul de inverno —
Fumaça do barco que parte,
insiste em ficar.
Um
longo adeus —
Perfiladas na estrada,
as flores de inverno.
A
chuva implacável —
Tanabatas coloridos,
do céu para o chão.
Após
a chuva,
pingos brancos no varal —
O frio pendurado.
Cerejeiras
em flor —
Envolvendo o Buda,
a nuvem rosada.
Nevoeiro
de inverno —
Em procissão para o céu,
luzes na montanha.
Vaso
natural —
Em frestas no casarão,
samambaias crescem.
As
gotas da chuva
sobre as flores no jardim —
Ah, que frio!
Entrada
da favela —
Barracos mal-acabados,
suinã em flor.
Presente
de mãe —
Com a visão abalada,
último cachecol.
Chuva
de folhas secas --
Velho casal, de mãos dadas,
segue seu caminho.
Caliandra
florida —
Sobre o calvo pedestre,
os pompons vermelhos.
A
rua vazia,
bares cheios de risadas —
Vento cortante.
Bruma
de inverno —
As luzes da cidade
apagam-se aos poucos.
Profunda
quietude —
A voz do mestre de haicai
e os grilos de inverno.
O
velho haijin,
selecionando poemas —
Inverno sereno.
Dente-de-leão
—
Sopro as sementes aladas
e faço um pedido.
Lendo
um velho livro,
vou só, madrugada adentro —
Início de inverno.
Névoa
sob a ponte —
os carros como que voam
no vale branco.
Lá
se vão os santos
para
mais um ano ao relento —
Mastro
junino.
Terço
junino —
No
coro de ave-marias,
latidos
de cão.
Poção
de quentão —
Velhas
de orelhas vermelhas
riem
sem parar.
Reza
de são Pedro —
O
garoto endiabrado
de
terço na mão.
Sol
de inverno —
Uma
calçada repleta,
outra
vazia.
Pássaros
de inverno —
ao
peso dos anus-brancos,
balançam
os galhos.
Pombo
de inverno —
Na
estátua de olhos vazados,
observando
a praça.
Vêem-se
da varanda,
no
céu límpido, os balões
no
lugar de estrelas...
Inverno
chegando —
Na
rua, desfile de mãos
no
fundo dos bolsos.
Lareira
crepita —
As
sombras em movimento,
os
corpos parados.
Hálitos
brancos —
As
risadas dos amigos
tornam-se
nuvens.
Mercado
de flores —
Na
prostituta e no crisântemo
o
mesmo branco.
Convite
ao silêncio
—
O
som das folhas secas
pisadas
na trilha.
Cochilar
de inverno —
Solta
um suspiro profundo
o
cão no tapete.
O
capim de inverno —
Na
paisagem desolada,
um
cavalo insiste.
Manhã
fria de outono —
Caminho
na rua da infância
calçando
sapatos.
Alvorada
fria —
Aninhado
nas folhas,
botão
de tulipa.
Folhas
amarelas —
Mestra
de haicai ensina
antigos
caminhos.
Noite
de outono —
Cedendo
à
indiferença
os
latidos cessam.
E
se foi o último
mosquito
sobrevivente —
Tapa
inesperado.
Outros
percorreram
este
caminho solitário —
Outono
avançado.
O
amigo recolhe
torrão
com muda de umê
—
Chuva
de outono.
O
silêncio
torna-se
um
passageiro do carro —
Outono
na estrada.
Madrugada
de outono —
No
bar, dançam forró
mulher
e alguns homens.
A
serra de outono —
No
início da descida
o
casal se cala.
No
primeiro dia
uma
branca outra vermelha —
Ah!
flores de maio.
Taturana
negra —
O
alerta e a mão da criança
estanca
no ar.
Céu
azul profundo —
Demora
a sumir na noite
avião
de carreira.
Arco-íris
de outono —
Debruçado
na janela
casal
observa.
O
velho recorda
sua
infância no terreiro —
O
café cereja.
Flores
do Alfeneiro —
Mesmo
a três
casas daqui
persiste
o perfume.
Os
peixes se foram —
Libélula
se equilibra
na
ponta da vara.
Um
tanto agradável
vagão
do Metrô lotado —
Prenúncio
de inverno.
Lua
nova espanta
os
pensamentos ruins —
A
filha atrasada.
Vento
adocicado —
Pelo
janelão aberto,
manacá-de-cheiro.
Chuva
de outono —
A
serra de todo dia
oculta
na manhã.
Árvores
na neblina —
Por
enquanto de si mesmas
apenas
esboços
Túnel
do metrô —
A
borboleta distante
de
todas as flores.
Fugindo
da chuva,
a
mariposa se aninha
em
meu paletó...
Sexta-feira
Santa —
Asso
as sardinhas e batatas
feito
minha mãe.
Céu
azul profundo —
Um
velho ensina a pilotar
o
avião de papel.
Caqui
maduro —
A
velha e o pano de prato
como
babador.
Céu
límpido de outono —
Meninas
e seus barquinhos
na
bacia azul.
Mercado
no outono —
Na
banca de fumo de corda
conversa
de velhos.
Tarde
de neblina —
Risco
tênue
delineia
a
serra encoberta.
Noite
de outono —
Amigos
bebem chá verde
e
escrevem poemas.
Sorrindo
percebo
a
idade de meus sapatos —
Chuva
de primavera.
Lua
cheia no templo –
cabeça
rapada do bonzo
iluminada.
Primeira
benção —
Odor
de dama-da-noite
na
entrada da igreja.
Domingo
de Páscoa —
As
velhas mãos portuguesas
desfiam
bacalhau.
Grama
de verão —
Na
estação abandonada
lota
a plataforma.
A
nuvem de outono
faz
sombra no Corcovado —
Tudo
o mais é luz.
Entrada
do aeroporto —
O
adeus às
quaresmeiras
antes
de embarcar.
Entre
o pescador
e
o cardume de curimbas
o
fio do destino...
Correria,
risadas,
crianças
de copo na mão —
Caça
aos vaga-lumes.
Por
sobre a enxurrada
medindo
com o olhar
o
alcance do pulo...
Manhã
de neblina —
Um
vulto sai lentamente
do
céu que baixou.
Em
silêncio,
o velho
pousa
seus olhos no amigo
envolto
em crisântemos
Mercado
de flores —
Vendedora
traz nos braços
um
jardim de rosas.
As
gotas de chuva
na
hortênsia
da floreira —
Que
noite tranqüila!
Mas
que Carnaval!
Desfilando
sem parar
a
chuva na calha...
Chuva
de verão —
Brota
de todos os cantos
um
cheiro de terra.
Final
de verão.
Murmura
na calha a água
que
há pouco era nuvem...
O
aguaceiro passa...
Nas
folhas da bananeira
de
novo o silêncio.
Tento
ajustar
o
foco do meu olhar —
Ah,
lua enevoada.
Badalar
do sino —
No
dia quente que começa
não
me sinto só.
Verão
avançado —
E
a baía de Guanabara
refresca
o olhar.
Amigos
se vão
no
início da madrugada —
Ah,
lua de verão!
Porta
centenária
abre-se
para bananeira
de
folhas rasgadas.
Passando
o Ano Novo
na
estrada com minha filha —
Mochilão
nas costas.
Calendário
novo
ao
lado da ferradura.
Só
pra garantir...
Broto
de bambu —
Sons
de flauta na cabeça
enquanto
mastigo.
Remanso
de rio —
Algazarra
dos meninos
junto
aos lambaris.
Sorriso
infantil
sob
a barba adocicada —
Colheita
de uvas.
A
viajante aranha
imóvel
no pára-brisa
curtindo
a paisagem...
Frio
de primavera —
Pára
uma faixa de sol
no
ponto de ônibus.
A
grande pancada
ondulando
pancadinhas —
Canto
da araponga...
Goteiras
na sala —
A
chuva de primavera
próxima
do vaso.
Adro
da Matriz —
No
jacarandá florido
comunhão
de pássaros
Festa
da Cerejeira —
curvada
velhinha observa,
última
florada?
Sítio
Nakazone —
No
portal de primaveras
família
feliz.
Noitinha
de inverno —
Chuva
nos vasos plantados
e
terra nas unhas.
Inverno
sereno —
Minha
filha, como é bela
mesmo
ao tomar sopa.
Homem
e mulher
a
televisão ligada —
Mantas
separadas.
Ganhando
ceroulas
-
e setenta e cinco anos -
o
tio sorridente.
O
Porto de Santos —
Nos
vãos das pedras geladas
pombos
ciscam graos.
Ah,
dedos libertos
na
minha velha sandália —
Inverno
acabando.